O termo “brain rot” foi eleito a palavra do ano pelo Oxford English Dictionary em 2024. A escolha reflete os impactos negativos de um fenômeno cada vez mais comum: a exposição permanente a conteúdos de baixa qualidade na internet.
A expressão, que pode ser traduzida como “cérebro podre”, destaca como o acesso exagerado a materiais como vídeos curtos e notícias sensacionalistas, entre outros, compromete a concentração, aumenta a fadiga mental e prejudica as relações interpessoais.
Tais consequências não ficam restritas a uma faixa etária: crianças, adolescentes e adultos enfrentam, cada um a seu modo, desafios semelhantes, o que merece atenção específica para que seja possível retomar uma relação saudável com essas mídias.
Por que o brain rot foi o destaque de 2024
Antes de tudo, vale sempre deixar claro que o “brain rot” não é literal. Ou seja, esse comportamento indesejado não tem nada a ver com um suposto dano físico ou comprometimento das estruturas do cérebro em si.
De qualquer forma, o “cérebro podre” é aquele que apresenta um suposto estado de deterioração em suas funções por conta do permanente contato com conteúdos incapazes de oferecer algum desafio à mente.
O termo em si não é novo. Em língua inglesa, ele já havia sido usado no século 19, mas em outros contextos. No entanto, voltou a ser empregado em discussões on-line ao longo de 2024, sobretudo pela geração Z.
Seja como for, não é difícil entender o que ele representa na prática. Basta pensar em duas situações específicas do dia a dia.
De um lado, o foco necessário para ver um filme ou ler um livro exige um nível mínimo de esforço, inclusive para que seja possível aproveitar minimamente a obra escolhida.
De outro, o smartphone está sempre por perto, com conteúdos que são acessíveis em poucos cliques. Eles geralmente aparecem em feeds infinitos, e a única exigência necessária para continuar visualizando-os é rolar a tela com a ponta dos dedos.
Quem nunca se sentou no sofá e ficou lá por horas vendo materiais inúteis em redes sociais e aplicativos de mensagens, sem notar sequer a passagem do tempo? Isso pouco a pouco causa uma redução na capacidade de concentração e uma letargia que impede a busca por estímulos, em tese, mais produtivos.
Como manter-se conectado constantemente afeta a qualidade de vida
De acordo com relatório da Data Reportal, uma plataforma de análise de dados, em 2024 havia quase 190 milhões de brasileiros conectados à internet. Desse total, quase 145 milhões usavam as redes sociais.
Nesse contexto, usar o celular foi a atividade principal durante o tempo livre entre a maioria dos entrevistados em uma pesquisa do Instituto Ipsos, encomendada pelo Nubank. Na prática, isso significa que se dedica mais tempo ao telefone do que descansando ou em atividades ao ar livre. Foram ouvidas 1.500 pessoas, em uma amostra representativa da população do país.
Essa avalanche de contato com as telas pode trazer uma série de efeitos indesejados que vão muito além do brain rot. As evidências sugerem que um maior consumo de conteúdo de baixa qualidade induzem a uma piora no bem-estar e até mesmo uma chance mais elevada de adoecimento psíquico.
Um estudo feito na Universidade Federal de Minas Gerais mostrou, por exemplo, que uma soma mais elevada de tempo de tela aumentava o número de sintomas de ansiedade, depressão e estresse em pessoas de todas as idades.
A exposição à tecnologia entre as crianças
Entre crianças, cujo organismo ainda está em desenvolvimento, o impacto pode ser ainda mais expressivo. Além de um maior número de quadros de ansiedade e depressão, o acesso desregrado à tecnologia aumenta a probabilidade do desenvolvimento de distúrbios de atenção, atrasos na capacidade cognitiva e problemas no sono, entre outras queixas.
Desse modo, a Sociedade Brasileira de Pediatria já recomendava que nenhuma criança antes dos dois anos tivesse contato com telas. Depois dessa idade, os dispositivos eletrônicos poderiam ser introduzidos na rotina, mas sempre de maneira bastante limitada e com a devida supervisão.
Foi nesse contexto que o começo de 2025 marcou a entrada em vigor de legislação específica para restringir o uso de celulares nas escolas.
Em resumo, esse tipo de medida tem como objetivo reduzir distrações em sala de aula e promover interações mais significativas entre estudantes.
Experiências de outras localidades mundo afora indicam que a restrição do uso de dispositivos móveis em ambientes escolares contribui para melhorar o desempenho acadêmico e reduzir sintomas de adoecimento psíquico entre os alunos.
Nada disso, claro, busca demonizar os recursos tecnológicos. Todavia, esse pode ser um primeiro passo para fomentar uma relação mais equilibrada com cada um deles.
Leia também: O impacto das apostas online sobre o bem-estar de crianças, adolescentes e adultos
Dicas práticas para evitar os efeitos do brain rot
Aquele desconforto associado ao medo de estar perdendo algo (o famoso Fomo, na sigla em inglês) ao se afastar da internet e do celular ou a dificuldade de completar tarefas sem a interrupção do smartphonepode ser um sinal de que você já está sendo afetado pelo brain rot.
Diante de tais sinais de alerta, vale sempre considerar alguns cuidados para retomar o foco sobre aquilo que realmente importa. Para isso, tente sempre que possível:
- Promover momentos de desconexão.
- Estabelecer limites para o uso de dispositivos e de redes sociais, especialmente em momentos de lazer e interação social.
- Priorizar conteúdos profundos e informativos em vez de vídeos curtos e notícias de caráter sensacionalista e sem fontes confiáveis.
- Buscar formas de relaxar longe da internet (técnicas de respiração e meditação podem ser úteis nessas horas).
- Restringir os comportamentos multitarefa e fazer uma coisa de cada vez.
- Retomar o hábito da leitura, de preferência em livros de papel (nem que seja por poucos minutos por dia).
- Praticar exercícios físicos regularmente.
- Encontrar momentos para passar mais tempo ao ar livre.
- Desenvolver novas habilidades e descobrir novos hobbies.
- Priorizar o sono, deixando o celular e outras telas longe do quarto.
Além de atitudes individuais para combater os danos do brain rot, incentive sempre que possível conversas sobre o impacto da internet e das redes sociais na saúde mental em escolas e espaços profissionais, o que pode fazer uma diferença significativa na vida de todos.
A equipe da CARE convida você também a refletir sobre essas questões e adotar pequenas mudanças que podem transformar a rotina, deixando-a mais saudável e equilibrada. Então, que tal atuarmos para elegermos juntos bem-estar, empatia e conexão como as nossas palavras do ano?
Este conteúdo foi elaborado pela equipe da CARE Global Partners, sempre pensando no seu bem-estar e no cuidado com aqueles que você ama.
Referências
‘Brain rot’ named Oxford Word of the Year 2024
https://corp.oup.com/news/brain-rot-named-oxford-word-of-the-year-2024/
Brain Rot: The Impact on Young Adult Mental Health
https://www.newportinstitute.com/resources/co-occurring-disorders/brain-rot/
12 Habits To Prevent “Brain Rot”
https://www.health.com/habits-to-prevent-brain-rot-8766150
Uso de telas por crianças e adolescentes
https://www.gov.br/participamaisbrasil/uso-de-telas-por-criancas-e-adolescentes
Sociedade Brasileira de Pediatria: grupo de trabalho saúde na era digital
https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/24604c-MO__MenosTelas__MaisSaude-Atualizacao.pdf
Sancionada lei que proíbe o uso de celular em escolas https://www.camara.leg.br/noticias/1126717-sancionada-lei-que-proibe-o-uso-de-celular-em-escolas/
As associações entre tempo de tela e saúde mental no ciclo vital
https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/61379